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Viva Elizabeth Teixeira: Líder camponesa é doutora pela UFPB
Um corredor de honra foi formado. Ao longo da passagem principal do auditório da reitoria da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) homens e mulheres enfileirados ergueram os braços segurando chapéus de palha e bandeiras das Ligas Camponesas, simbolizando a luta pela terra. As primeiras notas da música de Adeildo Vieira “Marcados para Viver” ecoaram cantadas pelo Coral Voz Ativa, o auditório lotado ficou de pé.
“Quem é marcado pra viver por inteiro e ocupa a vida como se fora posseiro, não deixa a morte invadir o seu terreiro, nem teme o algoz que tombou um companheiro. Segue com seus pares arando os campos de algodão e semeando os milhares hectares do coração(...)”, cantou o coral. Todos os olhos de um auditório lotado voltaram-se para a delicada mulher de 100 anos de idade que, em sua cadeira de rodas, foi conduzida por suas netas Ana Raquel e Juliana Teixeira.
Elizabeth Altina Teixeira, recebeu no fim de tarde da última sexta-feira (18), a máxima distinção que uma instituição de nível superior pode conceder, o título de Doutora Honoris Causa.
Acompanhada por uma comissão de honra feminina formada pelas professoras Iranice Muniz do Centro de Ciências Humanas, Sociais e Agrárias (CCHSA), Maria do Socorro Batista do Centro de Educação (CE), Gislaine da Nóbrega representando o NIPAM, e Roberta Candeia do Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) a homenageada foi recebida por uma multidão emocionada.
E foi “por causa de honra”, e por reparação histórica, como tantas vezes repetido nos discursos do evento, que a paraibana, líder das ligas camponesas, educadora popular e ativista em prol da reforma agrária no Brasil, Elizabeth Teixeira, foi reverenciada pela academia, pelos seus amigos e familiares, e por diversos membros de organizações ligadas ao campo que estiveram presentes no evento presidido pela reitora da UFPB Terezinha Domiciano.
Os gritos de “Viva Elizabeth Teixeira” foram repetidos inúmeras vezes ao longo da solenidade. No palco principal a mesa diretiva foi formada pela Reitora Terezinha Domiciano, pela Vice-reitora Mônica Nóbrega, pela professora Fabrícia Sousa Montenegro (CCHSA), pela Diretora do CE Adriana Diniz, pelo Coordenador da Secretaria dos Órgãos Deliberativos da Administração Superior Marcelo Sitcovsky, além de Rafael Reginaldo da Comissão Pastoral da Terra, Dilei Aparecida Schochet do Movimento dos Sem-Terra e Alane Maria de Lima do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas.
Juliana Elizabeth Teixeira, neta da homenageada, discursou sobre sua avó, falou da vida regrada dentro da casa do pai, do assassinato de seu esposo e líder camponês João Pedro Teixeira, da luta pelos direitos dos trabalhadores rurais, das perseguições sofridas, da tentativa de incêndio a casa da família, das diversas prisões durante a ditadura militar, do refúgio na clandestinidade por 17 anos para proteger a própria vida, da separação dos 11 filhos, da perda de 03 desses filhos, da atuação como educadora popular, e tantas batalhas enfrentadas com coragem por Elizabeth Teixeira.
“Nem a dor mais profunda foi capaz de silenciar sua voz ou deter sua marcha. Elizabeth transformou o luto em resistência, ela nos ensinou que resistir é amar em profundidade, e que a luta pela terra é também uma luta por dignidade, por justiça, e por futuro. Hoje nós netos, netas, bisnetas, tetranetos nos colocamos de pé para admirar e aplaudir a grandeza da sua trajetória, carregamos seu nome no coração e seu exemplo nos gestos. Sabemos que Elizabeth vive em cada mulher que existe, resiste; em cada criança sem-terra que sonha, em cada semente plantada em chão coletivo”, disse Juliana Elizabeth.
Elizabeth Teixeira foi vestida com as vestes talares doutorais pelas mãos de Gislaine da Nóbrega Chaves e de Roberta Candeia, uma beca preta e samarra na cor azul, representando as ciências humanas. Na sequência a reitora Terezinha Domiciano outorgou o título de doutora honoris causa.
No discuso panegírico a professora Iranice Muniz, exaltou a história de luta pela terra e pelos direitos dos camponeses liderada por Elizabeth Teixeira após o assassinato de seu esposo João Pedro Teixeira, em Sapé. A professora comentou sobre a atuação como Presidente da Liga Camponesa na Paraíba, quando não se curvou às ameaças de latifundiários dando continuidade à luta por trabalho digno, reforma agrária e justiça no campo.
“Mesmo com a alma ferida Elizabeth ensinava com ternura no coração e força no corpo, e nunca se deixou vencer. Essa honraria é o símbolo de nossa gratidão e do nosso reconhecimento, e sobretudo do nosso compromisso com a história e memória do campesinato brasileiro, que Elizabeth jamais permitiu que fosse esquecido”, disse Iranice Muniz.
Maria do Socorro Batista destacou que a homenageada foi a primeira mulher a liderar uma Liga Camponesa onde atuou com tenacidade e firmeza contra os latifundiários. “A história de vida de Elizabeth é considerada símbolo de luta e resistência, inspiradora de novas geração de camponesas e dos movimentos sociais do campo, sua vida foi marcada por tragédia e resistência, e sua luta contra as variadas formas de opressão incentivou a participação das mulheres na luta pela terra”, disse a docente.
Em alusão ao documentário de Eduardo Coutinho, “Cabra marcado para morrer”, que narra a história de vida de Elizabeth Teixeira, a reitora Terezinha Domiciano reafirmou que Elizabeth é uma mulher marcada para viver, e disse que o dia em que Elizabeth Teixeira se tornou doutora honoris causa ficará marcado como um dos mais importantes para a UFPB.
“É com gratidão e humildade que estamos aqui diante de uma ícone de resistência, que a UFPB hoje faz essa justa homenagem numa tentativa de retribuir pelo menos um pouco do que ela nos entregou com seu exemplo de vida e sua trajetória. É importante destacar que esse reconhecimento é coletivo de toda a UFPB”, disse a reitora.
Confira aqui a galeria de fotos do evento.
Fotos: Angélica Gouveia