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Eli-Eri: história de inspiração e amor à música será honrada com Medalha Villa Lobos
*Para ler essa matéria, sugerimos ouvir concomitantemente uma das composições de Eli-Eri Moura*
Sentado na sala de casa, na cidade de Campina Grande (PB) o pequeno Eli-Eri Moura, de apenas 07 anos, ensaiava os primeiros acordes no violão sob orientação do seu pai, um alfaiate e músico amador que regia o coral da igreja, e para quem a introdução musical fazia parte da educação básica de cada um de seus sete filhos.
A casa da família Moura era palco de noites em que a música unia a todos na tradicional seresta familiar, com cada um dos filhos tocando ao menos um instrumento. Essa convivência com a música, aliada ao ambiente de simplicidade e amor, despertou nele uma paixão que se tornaria sua missão de vida.
“Eu tenho alguma coisa com o número 03”, brinca o regente, compositor, pianista, flautista, pesquisador e professor do Departamento de Música da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). “Porque nasci no dia 30 do 03 (março), de 1963, às 03h da manhã, em Campina Grande”.
O estudo do violão aprofundou-se em casa, com as aulas particulares ministradas por um seresteiro, à base de bolero e música popular. O forte envolvimento com a música sacra deu-se na igreja frequentada pela família, onde integrou o coral. “Eu era contralto, que é a voz das mulheres, mas eu não tinha a voz amadurecida ainda então cantava junto com as contralto”.
Começou a aprender piano aos 10 anos, primeiro com a pianista da igreja, depois com Mércia Gouveia, aluna de José Alberto Kaplan, que viria a ser o futuro “pai acadêmico” de Eli-Eri no estudo da composição.
A formação musical de Eli-Eri foi marcada por uma busca constante por aprimoramento, estudou também violino, clarinete e flauta doce, sempre incentivado pelo desejo de explorar diferentes instrumentos e linguagens musicais.
Em 1981, morando em Campina Grande, Eli-Eri ingressou no curso de bacharelado em música – piano, na UFPB, em João Pessoa, para onde viajava diariamente por ocasião das aulas e atividades. Aos 18 anos, fez da UFPB sua segunda casa, ao ser contratado como músico flautista, para atuar no grupo universitário, do qual já fazia parte desde os 16 anos de forma voluntária, Cordas e Sopros.
Sua busca pela criação musical o levou a encontrar, em 1982, um mentor que acreditou em seu talento: José Alberto Kaplan. “Me lembro bem que de forma atrevida me apresentei pra Kaplan, disse que queria ser compositor e tinha algumas peças. Ele pediu para ver as peças, eu dei um monte de partitura para ele, e ele teve a paciência para ver todas. Ele disse que eu tinha muita criatividade musical, se dispôs a ser meu professor de composição de forma particular sem cobrar nada, e pediu apenas empenho e estudo”.
Desde então Eli-Eri foi Regente do Coral Universitário da Paraíba Gazzi de Sá; graduou-se em piano na UFPB em 1985, obteve seus títulos de Mestre e Doutor em Composição pela McGill University, no Canadá; foi regente do Madrigal da UFRN, do Grupo Anima (de música antiga); tornou-se membro da Academia Paraibana de Cinema ocupando a cadeira nº 50, e referência nacional.
Na UFPB, ingressou como docente em 2002, foi pioneiro ao ser o primeiro professor contratado para liderar a implantação do curso de Composição. Também fundou o Laboratório de Composição Musical (COMPOMUS) e formou gerações de estudantes apaixonados pela música. Para ele, ensinar é uma forma de manter viva a chama da criatividade e da troca de experiências. “Compor é um motor, mas compor é algo solitário, enquanto na vida acadêmica há esse convívio que me faz sentir vivo, gosto de ensinar e de estar na UFPB”, afirma.
Até hoje guarda com carinho os papéis com suas primeiras composições, feitas aos 7 anos, dedicadas aos pais, antes mesmo de aprender a escrever partituras, “é como se eu não tivesse tido outra opção, eu sempre soube que seria a música”.
Seu trabalho artístico é vasto e diversificado: mais de 200 composições que vão desde música contemporânea de concerto até trilhas sonoras para teatro, cinema e vídeo. Entre as obras consideradas mais especiais pelo compositor estão o Réquiem para Trombone, uma homenagem ao amigo Radegundis Feitosa, e a Ópera Dulcinéia e Trancoso, que rodou o Brasil em 2023, a peça para quarteto de cordas Circumsonanti e a peça Circunversus para flauta, clarinete, violino e violoncelo.
Além das diversas composições, artigos científicos, produção teórica, e dos 04 álbuns de composições autorais lançados, Eli-Eri é um músico inúmeras vezes premiado dentro e fora do Brasil. Quando perguntado qual a premiação mais importante para ele, afirmou rapidamente “A Medalha Villa Lobos”, honraria que lhe será entregue no dia 18 de julho de 2025, concedida pela Academia Brasileira de Música, e para a qual foi escolhido na categoria compositor.
Sobre esse reconhecimento confessa que foi algo não esperado. “Foi uma surpresa! A medalha Villa Lobos é o maior reconhecimento da academia em termos de música erudita, e por isso é muito significativo para mim ser reconhecido pelos pares, pelo trabalho, estendendo essa premiação ao trabalho que é feito na UFPB, pelos meus colegas, alunos, membros do Compomus. O trabalho é coletivo feito por pessoas que estão ao nosso lado”, afirmou o docente.
Mesmo após tantas conquistas, Eli-Eri mantém-se fiel à sua essência: a paixão pela composição e o desejo de ensinar. E quais seriam os planos para o futuro? Continuar compondo. No momento está trabalhando em sua terceira ópera, “Ópera do Cabeça de Cuia” e o que não faltam são encomendas de instrumentistas.
Apesar de acreditar que o caminho na música não é fácil, o docente considera que é uma trilha que recompensa. “Um recado para os jovens? Se você tem o dom, a vontade interna, não pode deixar de seguir essa sua vontade, porque por mais difícil que seja o caminho, se você tem a centelha da música ela nunca vai morrer, ela vai sempre estar em você”.
Para Eli-Eri, muito mais do que um ofício, a música representa uma fonte de força interior. “Música me salva. Em momentos difíceis ter essa chama dentro de mim me dá força para enfrentar o dia a dia. A música conecta as pessoas, no momento que você está no palco todos são iguais, compartilhando uma fraternidade através da arte”. Eli-Eri acredita no papel transformador e essencial da música na vida de quem a vive e compartilha, e deseja seguir ensinando e compartilhando o amor pela música enquanto for possível.